Osteoma Osteoide
É uma lesão osteoblástica, frequentemente benigna ativa, caracterizada por seu pequeno tamanho (em geral menos do que 1,5cm), com bordos frequentemente bem definidos e a presença frequente, mas não constante, de uma zona periférica de neoformação óssea reativa. O nicho é formado por tecido celular muito vascularizado que contém osteoide imaturo, mas benigno1.
Características clínicas
O osteoma osteoide pode se desenvolver em qualquer osso. A maior incidência ocorre nos ossos longos (aproximadamente 65% dos casos) principalmente no fêmur e na tíbia2. Pode ser encontrado no osso cortical e no osso esponjoso. A localização nas vértebras, especialmente no arco neural, é comum em nossa casuística.
Pode se localizar no acetábulo, na cabeça ou colo do fêmur, ocupando, nesses casos, a região intra-articular3.
Predomina nos adolescentes e adultos jovens. A lesão frequentemente é dolorosa, provavelmente pela presença de fibras nervosas no tumor4,5 ou devido aos níveis elevados de ciclo-oxigenases e prostaglandinas na lesão13. A dor não costuma aumentar de intensidade com a evolução e não guarda relação com o tamanho da lesão. A queixa clínica típica é a de dor persistente, vaga, que piora à noite e melhora com a utilização de anti-inflamatórios ou analgésicos, principalmente com os salicilatos. A dor melhora habitualmente em cerca de 30 minutos. No entanto, da mesma forma que nessa lesão benigna, outros processos neoplásicos e inflamatórios apresentam dor persistente, pioram à noite e também são aliviados pelos salicilatos.
Quando o osteoma osteoide se localiza em uma diáfise como a da tíbia, especialmente ao longo da borda subcutânea, pode haver tumefação, sensibilidade, eritema e endurecimento da lesão.
Quando o osteoma é localizado junto à articulação, pode ser acompanhado de reação articular e produção de líquido sinovial, simulando uma artrite.
O osteoma osteoide localizado na vértebra pode ocasionar o aparecimento de escoliose dolorosa. Pode ainda haver espasmo importante da musculatura que acompanha o quadro de cervico-braquialgia ou dor ciática e escoliose.
Diagnóstico por imagem
O osteoma osteoide clássico que ocorre na diáfise dos ossos longos apresenta-se como um nicho radio-transparente oval ou arredondado com uma zona reacional de esclerose densa ao redor da lesão. Há edema importante ao redor da lesão.
A imagem fornecida pela cintilografia do esqueleto mostra um aumento de concentração localizado, mas este achado não é patognomônico do osteoma osteoide e pode não auxiliar no diagnóstico diferencial6.
Antes de se proceder à biópsia ou à ressecção de uma lesão com essas características, deve-se confirmar o achado com mapeamento do esqueleto (que deve mostrar aumento importante da concentração), tomografia e ressonância magnética. A tomografia computadorizada é considerada o exame de maior precisão para o diagnóstico.
Diagnóstico diferencial
Deve-se diferenciar o osteoma osteoide do osteoblastoma. As principais diferenças são o tamanho (o osteoblastoma é maior), o grau de esclerose (o osteoma osteoide em geral tem um maior grau de tecido esclerótico circundante) e o curso natural (o osteoblastoma costuma ser mais agressivo). Outros diagnósticos diferenciais importantes são o abcesso de Brodie, a fratura de stress e a ilhota óssea7-9.
História natural
O osteoma osteoide é uma lesão autolimitada, com tendência à maturação espontânea em dois a cinco anos10,12. O nicho progressivamente se calcifica e ossifica, confundindo-se com o osso esclerótico ao redor. Com a maturação da lesão, a dor diminui. O curso natural é a transformação de uma lesão estágio B-2 (ativa) em B-1 (latente). A cintilografia continua mostrando um pequeno aumento da concentração, mesmo após a maturação e calcificação do nicho. Não há relatos na Literatura de transformação maligna.
Tratamento
O tratamento do osteoma osteoide consiste na ressecção ampla e completa do nicho com uma pequena área de esclerose a seu redor.
Não há necessidade de ressecção de toda a área de esclerose. Os procedimentos “intra-capsulares”, como a curetagem ou a abordagem do nicho com trefinas ou agulhas de radio-ablação, são utilizados, mas podem não destruir completamente o nicho e ocasionar recorrência em cerca de 10% dos pacientes13.No entanto, em localizações de difícil abordagem cirúrgica, esta deve ser a técnica de escolha. Deve-se, no entanto, indicar a ablação com grande cuidado junto aos nervos, estruturas vasculares e cartilagem articular. Alguns autores indicam a curetagem mecânica da lesão com brocas metálicas microcirúrgicas de alta velocidade que abrem uma cavidade no local aonde se localiza o nicho. Esse procedimento apresenta uma taxa de recorrência perto de 10%13.
Em nosso Serviço, preferimos o método tradicional de tratamento, com a abordagem direta da lesão e a ressecção do nicho com a utilização de trefinas. Ressecamos apenas uma pequena margem de osso reacional esclerótico ao redor da lesão.
Nos ossos longos das extremidades, realizamos o procedimento no Centro Cirúrgico, guiados por radioscopia tridimensional. Nas lesões que acometem a coluna ou as raízes dos membros, realizamos o procedimento na sala da tomografia14.
Nos últimos anos está se estudando a ablação do osteoma com o Ultrassom de Alta Intensidade guiado por Ressonância Magnética (MRgFUS). Ainda não há publicações sobre os resultados13.
Prognóstico
O prognóstico é bom, podendo haver cura com a evolução natural (algumas vezes o paciente refere anos de sintomas antes do desaparecimento completo da dor) ou com a cirurgia. As recorrências podem acontecer nos pacientes submetidos às cirurgias com imagens intra-lesionais ou marginais1. Nesses casos, o ideal é uma cirurgia de revisão de margens, para obtenção do controle total da lesão.
Referencias Bibliográficas.
1.Edeiken J, DePalma AF, Hodes PJ. Osteoid osteoma. (Roentgenographic emphasis). Clin Orthop Relat Res 1966 Nov;49:201-6.
2.Cohen MD, Harrington TM, Ginsburg WW. Osteoid osteoma: 95 cases and a review of the literature. Semin Arthritis Rheum 1983 Feb;12(3):265-81.
3.Norman A, Abdelwahab IF, Buyon J, Matzkin E. Osteoid osteoma of the hip stimulating an early onset of osteoarthritis. Radiology 1986 Feb;158(2):417-20.
4.Schulman L, Dorfman HD. Nerve fibers in osteoid osteoma. J B J S Am 1970 Oct;52(7):1351-6.
5.Sherman MS, Mcfarland G, Jr. Mechanism Of Pain In Osteoid Osteomas. South Med J 1965 Feb;58:163-6.
6.Lisbona R, Rosenthall L. Role of radionuclide imaging in osteoid osteoma. AJR Am J Roentgenol 1979 Jan;132(1):77-80.
7.Greenspan A, Steiner G, Knutzon R. Bone island (enostosis): clinical significance and radiologic and pathologic correlations. Skeletal Radiol 1991;20(2):85-90.
8.Greenspan A. Bone island (enostosis): current concept–a review. Skeletal Radiol 1995 Feb;24(2):111-5.
9.Greenspan A, Stadalnik RC. Bone island: scintigraphic findings and their clinical application. Can Assoc Radiol J 1995 Oct;46(5):368-79.
10.De Souza DL, Frost HM. Osteoid osteoma–osteoblastoma. Cancer 1974 Apr;33(4):1075-81.
11.Moberg E. The natural course of osteoid osteoma. J Bone Joint Surg Am 1951 Jan;33(A:1):166-70.
12.Fechner RE, Mills SE. Tumors of the Bones and Joints. 1st. 1993. Washington, D.C., Armed Forces Institute of Pathology. Atlas of Tumor Pathology. Ref Type: Serial (Book,Monograph)
13.Campbell’s Operative Orthopaedics, 13th Edition – Elsevier. Philadelphia, PA, 2017.
14.Jesus-Garcia, R. Tumores Ósseos – Diagnóstico e Tratamento. 2ª. Ediçao. Editora Elsevier. Rio de Janeiro, 2013.